12 abril 2009
"Mais uma tarde sem jeito nenhum" - II
Durante seis semanas, o Sebastião, que era e ainda é o gato da vizinha da frente, mudou-se lá para casa e até parecia que aquele sempre tinha sido o seu único e amado lar, o que não é muito comum nos gatos, adaptarem-se tão facilmente a um novo espaço! De início, ele até lhe achava alguma graça, principalmente quando se escondia nos sítios mais improváveis que possam imaginar ou quando subitamente desatava a correr da sala para o quarto ou vice-versa, como se fugisse de um fogo ou de um cão, o que é a mesma coisa, porque o medo sempre foi um sentimento tremendamente transversal. Mas algum tempo depois e cansado de ter de servir de pajem ao gato, sempre que queria beber água ou se enfiava atrás da máquina de lavar roupa, sem conseguir sair, o idílio transformou-se num pesadelo que apenas tinha uma única coisa boa: o fim à vista! A vizinha voltou, quis pagar os estragos infligidos ao sofá, oferta que ele pronta e delicadamente recusou, não fosse ela voltar a pedir-lhe para o deixar de novo e apenas por “alguns dias” lá.
A sua relação com os animais, quase todos os animais, sempre tinha sido difícil. E até aí... tudo bem. O que lhe custava mesmo era ouvir dizer que “Os animais sentem quem é ou não é boa pessoa” ou ainda, “Eles percebem que tens medo, e pronto!” Já não lhe bastava o estigma de ser arranhado, mordido e humilhado por tudo o que tivesse mais de duas patas, ainda tinha de escutar longos sermões sobre etologia, vulgo "psicologia animal" e outras descobertas maravilhosas, tão bem apregoadas... principalmente por parte dos babados donos dos animalejos!
Havia no entanto, um género de animais que, para além de o tranquilizarem imenso, lhe recordavam uma infância feliz e com os quais nunca tinha tido qualquer tipo de desentendimento: os peixes de aquário (convém frisar este pequeno detalhe...)
Esse elo que o ligava ao mundo animal era praticamente desconhecido por todos os seus amigos e até pela Rita, com quem viveu durante três agridoces anos. Não lhe agradava admitir esse gosto, aparentemente pouco másculo, com receio de ser gozado, mesmo que se tratasse apenas de uma “brincadeira”. Isso tinha já acontecido, há tantos anos atrás, num momento em que optou por ficar a assistir ao nascimento dos Platys, em vez de ter ido jogar à bola. Desde essa altura e durante alguns meses, passou a ser conhecido como o “Barbatana”. Felizmente, as alcunhas tinham sempre pouca duração e desde “Oculetas” a “Pastilha” ou de “Bifanas” a “Livrinhos”, quase tudo lhe chamaram.
Presentemente não tinha nenhuma alcunha, pelo menos que o soubesse.
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